No último dia 15, Paul Stenson publicou na página do seu estabelecimento, o White Moose Café, um comentário sobre uma entrevista de emprego que havia feito com um brasileiro.
“Pobre rapaz, sempre que queria dizer ‘cozinha’ (kitchen, em inglês), ele dizia ‘frango’ (chicken). ‘Eu quero muito ser assistente de frango’. ‘Eu gosto de frango’. ‘Seu frango é grande?’ Nunca foi tão difícil me manter sério em toda minha vida”, disse Stenson no texto (abaixo), que recebeu 1,3 mil curtidas e foi compartilhado 67 vezes.
Podem não ser números expressivos em comparação com conteúdos que viralizam na internet, mas foi o suficiente para desencadear uma retaliação que aos poucos tomou uma grande proporção.
O White Moose recebeu em questão de poucos dias milhares de avaliações negativas no Facebook. Acusado de xenofobia, seu dono também foi alvo de mensagens agressivas.
“Gostamos de fazer graça com as pessoas. Não é para ser uma página séria. Mas alguns brasileiros levaram para o lado errado e criaram uma campanha para nos atacar”, diz Stenson à BBC Brasil.
“Quando comecei a receber mensagens com ameaças, percebi que a coisa havia ultrapassado um limite. Não é mais divertido se isso acontece.”
Os primeiros sinais da retaliação vieram cinco dias após o primeiro post ir ao ar. Em uma hora, o café recebeu 24 avaliações com uma estrela, a nota mínima na rede social, deixadas por brasileiros.
“Nenhum desses infelizes já esteve no café. Se vocês acham que essas avaliações negativas terão algum impacto na nossa nota, vocês terão de fazer melhor. Nós temos 14 mil avaliações cinco estrelas. Boa sorte em tentar superar isso”, disse Stenson ao comentar o assunto.
“É uma pena que vocês apenas deem a nota de uma estrela e não escrevam nada. Não podemos rir do seu inglês se vocês não escrevem nada.”
As provocações continuaram nos dois dias seguintes. Primeiro, o empresário publicou um e-mail enviado por uma brasileira em que ela se queixava do post e dizia ter alertado uma rádio sobre o assunto.
Stenson respondeu ironicamente: “Por favor, não faça isso. Não queremos ser assunto de uma rádio em cadeia nacional nem queremos a publicidade ou dinheiro que isso nós geraria”.
As avaliações negativas continuaram a se multiplicar, e ele voltou a escrever na página do White Moose. “As notas de uma estrela continuam a chegar rapidamente e em grande volume. Mas a maioria delas não têm texto. Se algum brasileiro for capaz de escrever uma avaliação usando um inglês perfeito, ganhará um jantar com frango.”
Depois, prometeu premiar com uma “depilação ao estilo brasileiro” a quem desse uma nota cinco estrelas ao café, a fim de contrabalancear as avaliações negativas de brasileiros. Também trocou a imagem que ilustra a página do estabelecimento na rede social por uma foto do lutador brasileiro José Aldo sendo nocauteado pelo irlandês Conor McGregor. “Somos uma página de sátira e estávamos nos divertindo com provocações amigáveis”, afirma Stenson.
Não foi desta forma que os administradores do site de humor Capinaremos encararam a questão. Depois de serem alertados sobre o assunto, o portal convocou seus mais de 250 mil seguidores no Facebook a avaliarem negativamente o café.
“Não foi por causa da piada inicial. Somos um site de humor, e sabemos que provocações assim são normais na internet”, diz Sandro Sanfelice, um dos administradores do Capinaremos.
“O problema foi com o comportamento dele após isso. Ele fez comentários elevando o grau de zoeira e nós só contra-atacamos. Pensei muito antes de convocar nossos seguidores, porque a ideia dele é conseguir publicidade de graça, mas decidimos entrar na brincadeira.”
Não demorou para que o estabelecimento contabilizasse mais de mil notas de uma estrela.
“Se vocês denunciam minha página, ela fica temporariamente fora do ar. Como vocês vão avaliar negativamente uma página que não pode ser acessada? Usem suas cabeças. Vocês me desapontaram. Por favor, melhorem sua performance ou não conseguirão nada mais que envergonhar seu país”, disse Stenson.
Mesmo quando as avaliações negativas já eram mais de 5,7 mil, ele não se intimidou: “Em um país grande como o seu? Isso é patético. Se não tiverem 10 mil na próxima hora, perderei todo o respeito por vocês.”
Stenson ainda anunciou um especial do dia, sanduíche de frango, com um desconto para brasileiros, ofereceu café de graça para argentinos e mudou foto do avatar da página para uma montagem com a imagem do jogador Pelé em que se lê: “Eu amo o branco Moose café”.
Logo, o estabelecimento já acumulava 14 mil avaliações negativas no Facebook. Foi quando Stenson decidiu bloquear a página para acessos a partir do Brasil, levando os brasileiros a darem notas baixas para o café em outro sites de avaliação de locais e serviços, como o Trip Advisor e o Google.
No Trip Advisor, as centenas de avaliações negativas já foram retiradas. Em nota à BBC Brasil, o site informa que “por não serem avaliações feitas com base em uma experiência própria do autor, mas por reação a um relato ou notícia, elas violaram nossas regras e foram removidas”.
“Sempre que os comentários estiverem de acordo com nossas regras, sejam positivos ou negativos, serão mantidos no ar”, diz o Trip Advisor.
O episódio perdeu a graça para Stenson quando ele passou a receber mensagens agressivas no Facebook.
“Diziam ‘espero que você morra’, ‘vamos pegar você’, ‘sabemos onde você vive’. Uma pessoa me enviou uma cópia da minha carteira de motorista (na qual consta o endereço de sua casa), que teria sido publicada pelo Capinaremos, e falou ‘olha só o que temos’. Outra me mandou uma foto de uma casa em chamas”, diz o empresário.
“Não é divertido é receber comentários abusivos ou ameaças. Era só brincadeira, por diversão. Nunca disse nada desagradável.”
Nathália Caltabiano, de 27 anos, discorda do empresário. Ela mora atualmente em Dublin e sentiu-se ofendida não só quando ele caçoou do nível de domínio do inglês dos brasileiros como quando respondeu a um comentário deixado por um seguidor da página do White Moose.
Esse usuário dizia para Stevenson não brigar com os brasileiros, porque eles “são bons de conseguir passaportes falsos e fraudar benefícios sociais”, ao que ele respondeu: “E não esqueça do sexo. Eles são bons para sexo também”.
“Quem se ofenderia ao ouvir que é bom de cama? As melhores noites que tive foram com brasileiras. Eles deveriam ver isso como um elogio”, diz Stenson. “Não sou xenófobo. Tenho quatro funcionários e amigos brasileiros. Se eles dizem que sou xenófobo, eu digo que eles são ‘humorfóbicos’.”
“Falar isso é como alguém dizer que não é homofóbico porque tem amigos gays”, diz Caltabiano.
“Ele falou que nós somos bons para sexo, não bons de sexo. A preposição muda tudo. Ele acha que nosso inglês não é bom, mas sabemos diferenciar uma coisa da outra. Já temos essa fama, e ele só reforçou o estereótipo. Não se pode fazer piadas assim, ainda mais em nome de uma empresa.”
Ela concorda, no entanto, que houve exageros: “Eles nos desafiou e respondemos. Mas não devia ter ido além disso. Algumas pessoas passaram do limite, mas foi uma resposta a comentários bem pesados que vieram dos seguidores da página dele. Um deles chegou a dizer que brasileiros não tem cérebro por causa do zika vírus e postou uma foto de uma criança com microcefalia, por exemplo”.
Sanfelice, do Capinaremos, diz que a imagem da carteira de motorista de Stenson não foi publicada por sua equipe, mas em um comentário em um dos posts feitos na página do site de humor no Facebook.
“Tiraram essa imagem do perfil pessoal dele, onde ela havia sido compartilhada de forma pública. Vamos tirá-la do ar para causar problema ao Paul”, afirma Sanfelice.
“Nunca incentivamos nem autorizamos ataques pessoais. Foi a forma que encontramos de retaliar a zoeira feita por ele. Mas, por mim, o assunto já morreu. Foi só uma treta que encontramos e abraçamos nos últimos dias. Que ele seja feliz com as provocações dele.”
Não se trata da primeira vez que o White Moose é alvo de uma campanha assim. Stenson provocou a ira de veganos, que excluem alimentos feitos a partir de animais de sua dieta, ao publicar um comentário no Facebook em agosto de 2015 em que dizia:
“Atenção, veganos: por favor, não venham a nosso café sem antes avisar e não nos olhem espantados por não haver 50 mil itens no menu compatíveis com os requisitos idiossincráticos de sua dieta. Nosso chef ficará feliz em preparar uma série de pratos para vocês, mas um aviso antes de sua visita será apreciado.”
Assim como desta vez, choveram reclamações e avaliações negativas na página. Stenson reagiu: “Todos os veganos agora serão barrados em nosso café. Qualquer vegano que tentar entrar será alvejado à queima-roupa. Normalmente, não matamos nossos clientes, mas como vocês dizem que ‘carne é assassinato’, então, é justo que matemos animais e também humanos”.
Mesmo diante dessas duas polêmicas, ele insiste que não mudará seu comportamento: “Nossa página é para ser divertida. Não vou parar de fazer brincadeiras. A vida é muito curta para ser chato”.